Por Maíra Lira Oliveira*
A energia limpa representa uma transformação essencial no modelo energético global, aliando a sustentabilidade ambiental à equidade socioeconômica. Trata-se da transição para fontes renováveis realizada de forma a garantir que seus benefícios alcancem todas as camadas da sociedade, especialmente as mais vulneráveis. Isso inclui desde a democratização do acesso à energia até a criação de empregos dignos na cadeia produtiva das tecnologias verdes. Porém, a proposta vai além da redução de emissões de carbono: ela busca corrigir desigualdades históricas, promovendo inclusão, participação comunitária e desenvolvimento regional sustentável.

Para o mercado, essa abordagem representa uma oportunidade estratégica. As empresas que investem em energia limpa com foco na justiça social não apenas se alinham às diretrizes globais de sustentabilidade e aos critérios ESG, como também fortalecem sua reputação e abrem espaço para novos modelos de negócio, mais resilientes e inovadores. Além disso, políticas e projetos que combinam transição energética com inclusão social atraem investimentos públicos e privados, geram estabilidade regulatória e estimulam o crescimento econômico de longo prazo. Dessa forma, a energia limpa com justiça social se consolida como uma solução eficaz tanto para enfrentar a crise climática quanto para promover um desenvolvimento mais justo e equilibrado.
A transição para fontes de energia limpa é um desafio global, e o Brasil, com sua matriz majoritariamente renovável, ocupa uma posição de protagonismo nesse cenário. No entanto, para que essa transição beneficie toda a população, é necessário mais do que investimentos em infraestrutura: é preciso garantir a inclusão social, especialmente das comunidades mais vulneráveis.
Esse protagonismo brasileiro se reflete em números expressivos. Mais de 80% da matriz energética do país é composta por fontes renováveis, como hidrelétricas, energia solar, eólica e biomassa. O Brasil é líder em energia solar fotovoltaica na América Latina, com mais de 14 GW instalados até 2024, e já ultrapassou 7,7 GW em capacidade de geração eólica. Apesar desse avanço, o acesso à energia limpa ainda é desigual, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste, onde comunidades de baixa renda enfrentam barreiras para usufruir de soluções sustentáveis.
Embora a eletricidade alcance 99% da população, muitas áreas ainda carecem de acesso a fontes renováveis. Isso porque o custo de implementação de energia solar fotovoltaica é alto, o que impede que muitas famílias adotem essa tecnologia. Além disso, os grandes projetos de energia renovável estão concentrados em regiões mais desenvolvidas, deixando os mais vulneráveis sem os benefícios dessa revolução energética.
Para que o Brasil avance em energia limpa com justiça social, é preciso adotar políticas públicas inclusivas. Entre as medidas fundamentais estão os subsídios para a instalação de sistemas solares em residências de baixa renda, facilitando o acesso à energia renovável para as camadas mais vulneráveis da população. Além disso, investir em tecnologias acessíveis — como painéis solares de baixo custo e soluções eficientes de armazenamento de energia — é essencial para garantir que essas inovações estejam ao alcance de todos. Micro redes solares e a geração distribuída também se destacam como alternativas viáveis para levar energia limpa a regiões isoladas e de difícil acesso.
No entanto, para que essas ações ganhem escala e impacto, é indispensável a colaboração entre os setores público e privado. Parcerias público-privadas (PPPs) podem viabilizar projetos de energia renovável em áreas carentes, unindo investimento, conhecimento técnico e infraestrutura. Complementarmente, iniciativas comunitárias, como cooperativas de energia, fortalecem o protagonismo local, permitindo que as próprias comunidades participem ativamente da gestão e produção de sua energia, promovendo não apenas sustentabilidade ambiental, mas também inclusão e autonomia social.
Exemplo disso é o projeto de energia solar fotovoltaica na Ilha do Marajó, no Pará, que leva eletricidade a comunidades isoladas sem acesso à rede elétrica convencional. A iniciativa tem promovido inclusão social ao garantir energia para escolas, unidades de saúde e atividades produtivas locais, como pesca e artesanato. Além disso, capacita moradores para operar os sistemas, gerando emprego e autonomia. Combinando sustentabilidade ambiental e desenvolvimento regional, o projeto mostra como a energia renovável pode transformar realidades e reduzir desigualdades de forma concreta.
Por fim, concluo que o Brasil tem tudo para ser um modelo global de energia limpa e justa. Contudo, é necessário um esforço conjunto entre governo, empresas e sociedade civil. Investir em tecnologias acessíveis, criar incentivos fiscais e fortalecer iniciativas comunitárias são passos cruciais para garantir que a transição energética beneficie todos os brasileiros. Embora o Brasil tenha avançado em energia limpa, a justiça social precisa ser o centro da transição energética. Garantir que as populações mais carentes se beneficiem dessa mudança é essencial para uma revolução energética que seja realmente transformadora e inclusiva.
*Maíra Lira Oliveira é diretora Jurídica da Corning na América Latina e Caribe