Inovação na prática – Colaboração e Responsabilidade

Por Bruno Maranhão – Especialista em Inovação e Consultor fundador da Ventana Consultoria.

As empresas tradicionalmente sempre tiveram a responsabilidade como um aspecto fundamental para suas culturas hierárquicas, baseadas em parte na tradição militar que sempre inspirou as teorias de administração de empresas.

Desde seu início com o Taylorismo, passando por todas as outras teorias, o Fordismo, o Toyotismo e mesmo com as contribuições das pesquisas sobre a importância das relações humanas para a produtividade das empresas, com a Experiência de Hawthorne, a responsabilidade sempre foi um dos aspectos determinantes para as organizações em geral.

Organogramas funcionais, descrição de cargos, planos de carreira e todas as boas práticas de liderança sempre tiveram como base a responsabilidade. A partir do aumento dessa responsabilidade um profissional tinha mais subordinados e ganhava cada vez mais, até que conquistava a maior de todas as responsabilidades assumindo um cargo de Direção, Presidência ou CEO.

Como consequência dessa estruturação das empresas em torno da responsabilidade, a limitação dela, por contrário senso, também se tornara determinante para a construção de carreiras, surgindo então outro pilar das organizações: o trabalho em equipe.

O trabalho em equipe surge como um complemento da divisão de responsabilidades num momento em que as empesas se tornaram gigantes corporativos e multinacionais. E nesse sentido completa a divisão de responsabilidade ao definir papéis claros e objetivos das atribuições de cada um dentro de uma equipe funcional.

Enquanto o mundo corporativo acumulava aprendizado na construção de estruturas hierárquicas e trabalho em equipe, surgem as empresas de tecnologia do Vale do Silício, que com estruturas menos hierarquizadas foram capazes de gerar inovações que mudaram as regras do jogo da competitividade, e inclusive do trabalho em equipe e da divisão de responsabilidades.

Apple e HP são algumas dessas empresas que deram novos contornos à hierarquia tradicional por meio da colaboração, tão fundamental para o surgimento da inovação.

Desde então as empresas tradicionais têm buscando desenvolver cada vez mais o trabalho colaborativo, sem precisamente compreender que para isso a relação com a responsabilidade deve ser absolutamente outra.

Talvez você já tenha escutado a expressão: “cão que tem dois donos morre de fome”. Essa expressão reflete a relação tradicional das empresas com a responsabilidade. Já com o trabalho colaborativo, a expressão passa a ser: “cão que tem dois donos nunca morre de fome e tem mais chance de crescer bem alimentado”.

Isso se deve ao fato de que essa nova relação com a responsabilidade, a partir do advento da colaboração como forma de organização do trabalho, não está baseada na divisão de tarefas, e sim no comprometimento de todos com o resultado final, ou seja, a responsabilidade de cada um vai além das limitações determinadas pela divisão de tarefas do trabalho em equipe ou do organograma formal. É como se cada um na empresa, do estagiário ao CEO, compartilhassem da mesma responsabilidade.

É uma mudança sutil, mas que invade as tradicionais estruturas hierárquicas de tal forma que afeta suas relações de poder, e por isso, não é possível ser aplicada de qualquer maneira, sem que sejam trabalhados seus impactos culturais e comportamentais.

O trabalho colaborativo que gera inovação na prática só é possível quando a empresa cria em seus colaboradores um senso de responsabilidade tão grande a ponto de cada um se sentir tão responsável pelo seu sucesso quanto o próprio dono, CEO ou Presidente.

Esse é o verdadeiro sentimento de dono que muitas empresas tentam criar no seu ambiente de trabalho, mas que na prática é um desafio quase intransponível, a começar pela cobrança de que todos tenham o mesmo grau de responsabilidade de um CEO, embora isto não seja acompanhado pelas mesmas condições de poder, autonomia e remuneração deste.

A necessidade de se gerar tamanho senso de responsabilidade sem as devidas contrapartidas é um dos motivos pelo qual empresas tracionais têm buscado desenvolver um propósito, que deve ser algo muito além do que simplesmente “remunerar o capital dos acionistas”, frase que se observa em 90% dos quadros de missão, visão e valores das empresas.

Sem o desenvolvimento desse propósito, qual seria o motivo para se assumir tamanha responsabilidade, a não ser que seja baseado num sentido pessoal de vida?

Particularmente não acredito que apenas a criação de um propósito seja o suficiente para se gerar esse grau de engajamento, mas que, além de ser um propósito coerente e verossímil, também é fundamental que se selecione profissionais com alto grau de comprometimento e que tenham prazer em exercer suas profissões, bem como um ambiente de trabalho harmonioso e seguro psicologicamente.

A colaboração é fruto de um alto nível de responsabilidade de todos com o resultado da organização, e se assim for, o ato de colaborar se torna natural e surgirá independentemente da estrutura hierárquica e da divisão de atividades.

Como já foi comentado em outros textos desta coluna, a inovação e o risco são indissociáveis e por isso a colaboração é tão fundamental, pois apenas por meio dela é que esse risco é mais facilmente compartilhado, tornando-se mais leve para um indivíduo ou departamento que tenta algo novo. Diferente do que acontece na empresa tradicional em que o grande objetivo de todos numa equipe é não correr riscos, seja o risco individual de uma carreira, ou o rico geral da empresa, atitude que ao final elimina as condições necessárias para a inovação.

A colaboração e a responsabilidade se tornam faces da mesma moeda quando todos compartilham da mais alta responsabilidade dentro da organização, a ponto do erro de um colaborador ser o erro de todos, assim como o sucesso de um ser o sucesso de todos. Quando a organização consegue isso, a colaboração se torna não apenas natural como também necessária.

Seguindo a sequência de lições para a inovação na prática, chegamos então à quarta lição: a colaboração que gera inovação só é possível quando todos assumem a responsabilidade integral pelo resultado da organização.

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