Mudança de nível
Nova legislação brasileira estipula índices de rendimento mais rigorosos para motores elétricos, que têm se tornado cada vez mais eficientes.
Os motores elétricos respondem por grande parte do consumo de energia na indústria. Por outro lado, os gastos com eletricidade representam quase a totalidade dos custos que se têm com esse tipo de equipamento ao longo de sua vida útil.
Com base nessas constatações, o mercado que gira em torno das áreas de elétrica e de energia tem carregado uma bandeira no intuito de difundir a utilização de motores com rendimento cada vez maior.
O instrumento utilizado para quantificar e regular essa questão é a legislação que determina níveis mínimos de eficiência energética aceitáveis para os produtos.
Um grande passo nesse sentido está sendo dado neste momento com o estabelecimento de novos índices, que tornam o regulamento mais rigoroso ao exigir valores mais elevados de eficiência para os motores.
Algumas especificações já estão em vigor, mas ainda há prazos estipulados para regularização vencendo neste e no próximo ano.
A legislação em questão é a Portaria Interministerial nº 1, de 29 de junho de 2017 e publicada no dia 30 de agosto de 2017, determinando os níveis mínimos de eficiência energética aceitáveis para motores elétricos trifásicos a serem comercializados no Brasil, sejam eles novos ou usados.
O documento estabelece os níveis mínimos a serem adotados por motor de acordo com cada potência e número de polos, sempre considerando 100% de carga e condições nominais de operação.
A portaria engloba os motores elétricos trifásicos de indução rotor gaiola de esquilo de 0,16 a 500 cv, de 2, 4, 6 e 8 polos (ou 3.600, 1.800, 1.200 e 900 rpm, respectivamente), e também máquinas motrizes que contenham motores.
Os Índices de Rendimento para motores elétricos adotados no Brasil seguem especificações da ABNT e são chamados de IR. O índice vai de IR1 a IR5. Quanto maior o número, maior o rendimento, ou seja, cada nível superior significa um degrau a mais na escala de eficiência que compara os motores.
Anteriormente, o Índice de Rendimento mínimo regulamentado no Brasil para motores trifásicos com potência de 1 a 250 cv, com regime de trabalho contínuo, era o IR2 (Alto Rendimento). Agora, a faixa de potência foi ampliada (para 0,16 a 500 cv) e o Índice de Rendimento mínimo passou a ser o IR3 (Rendimento Premium).
Os níveis de rendimento são bastante semelhantes aos exigidos pela norma internacional IEC – onde são chamados de IE. “Na Europa e Estados Unidos o índice de rendimento mínimo é o IE3, ou Rendimento Premium. Já no Brasil o nome é IR3 Rendimento Premium. Como cada país possui normas específicas, as nomenclaturas variam um pouco devido à tradução entre os idiomas”, diz Cristiano Pless, executivo da fabricante Hercules Motores Elétricos.
Agora os motores elétricos precisam ter a indicação do nível IR3 grafado em sua placa de identificação e estar cadastrados no Programa Brasileiro de Etiquetagem (PBE), coordenado pelo Inmetro.
O usuário pode fazer a checagem diretamente na placa do equipamento e verificar sua correspondência no portal do Inmetro, que será o órgão responsável pela fiscalização, acompanhamento e avaliação do cumprimento da portaria.
Em caso de não conformidade, os fabricantes responsáveis podem ser penalizados com suspensão das vendas e determinação da retirada dos lotes indevidos do mercado.
Na opinião de Fernando Garcia, diretor de Vendas da WEG Motores – América do Sul, os fabricantes nacionais, em geral, respeitam as definições e os produtos importados têm sua fiscalização realizada na entrada no Brasil, o que costuma funcionar bem. O risco, aponta ele, está nos casos onde o motor é parte de um equipamento maior. “Isto pode passar desapercebido da fiscalização, tornando fundamental a atenção e verificação pelo consumidor final ou comprador do equipamento”, alerta.
Prazos e adaptação
A data limite para fabricação no País ou importação dos motores que não atendam à portaria, a contar da publicação, é de dois anos – ou seja, 30 de agosto de 2019. No caso de motores importados, até a data fixada deveriam ter sido emitidos os conhecimentos de embarque.
A data limite para comercialização no País dos motores que não atendem à portaria era de dois anos e seis meses a contar da publicação, ou seja, 29 de fevereiro de 2020. A data limite para fabricação no País ou importação de máquinas motrizes de uso final, cujos motores componentes sejam objeto da regulamentação, e que não atendam ao disposto na portaria será de três anos a contar da publicação, ou seja, 30 de agosto de 2020. A data limite para comercialização no País de máquinas motrizes de uso final será de três anos e seis meses a contar da publicação, ou seja, 28 de fevereiro de 2021.
O mercado acredita que os fabricantes estabelecidos no Brasil, de forma geral, não terão maiores dificuldades para atingir o nível mínimo de eficiência IR3 e atender à portaria. O aumento do rendimento dos motores elétricos exige basicamente três grupos de providências: otimização do projeto elétrico/mecânico; utilização de materiais ainda mais nobres e emprego de maior quantidade de material ativo.
A WEG, por exemplo, tem linhas nacionais de motores com nível de eficiência equivalente até o nível IR5. “Já possuíamos há muito tempo a linha IR3 em nosso portfólio. Isto porque atendemos o mercado externo, em especial Europa e Estados Unidos, que tiveram esta mudança bem antes do Brasil. E também porque eficiência energética é uma forte diretriz na WEG, que se antecipa às legislações. Desenvolvemos e fabricamos no Brasil, a preços competitivos, os motores elétricos trifásicos mais eficientes disponíveis no mercado mundial”, orgulha-se Fernando Garcia.
A ABB Brasil informa que utiliza materiais nobres em todos seus motores e que prima por projetos que aumentem a eficiência e a vida útil dos equipamentos. A companhia também observa que as regulamentações na Europa aconteceram antes do que no Brasil, e, por isso, a ABB já possui projetos que atendem os níveis IE4 e até mesmo IE5. Desta maneira, o desenvolvimento de motores que atendam o nível IR3 para o Brasil aconteceu de forma natural. “Além dos motores IR3, a ABB já trabalha há alguns anos com diferentes tecnologias que atingem níveis maiores de rendimento, que ainda não foram estabelecidos pela regulamentação brasileira, como os já citados IE4 e IE5”, comenta Felipe Oliveira, gerente de Produto de Motores de Baixa Tensão da ABB Brasil.
O engenheiro eletricista Cristiano Pless, porta-voz da Hercules Motores Elétricos para esta reportagem, confirma que a companhia adota em sua linha uma combinação das três estratégias citadas a fim de aumentar o rendimento dos equipamentos que produz. “Realizamos diversos investimentos em máquinas e ferramentais visando a melhoria da produtividade e da qualidade de fabricação dos motores”, informa.
Parque de motores
Estudos indicam que os motores respondem, em média, por cerca de 70% do consumo de energia elétrica na indústria – o que equivale a quase a metade de toda a eletricidade consumida no mundo.
Em alguns segmentos de atividade a participação dos motores no consumo total de energia é bem mais destacada. É o caso das áreas de cimento (99%), têxtil (98%), papel e celulose (95%), mineração e peletização (92%) e ferro-gusa e aço (84%).
O problema é que a ‘idade’ dos equipamentos em funcionamento no País é alta, o que permite concluir que boa parte desses ativos certamente está ultrapassada, do ponto de vista de eficiência energética, o que significa que há um grande desperdício de eletricidade nesse meio.
Felipe Oliveira, da ABB, observa que o Brasil é um País muito grande, com diferentes características regionais e vários tipos de indústrias. De modo geral, entende ele, o parque fabril local de fato encontra-se defasado. Mas para tudo há solução, conforme analisa o executivo: “Os motores elétricos e suas novas tecnologias estão inteiramente à disposição das empresas que querem se modernizar e colher economias no curto e médio prazo em relação ao consumo de energia. A entrada em vigor da nova portaria está impulsionando a troca do parque fabril por motores mais eficientes. Com isso, cabe às empresas realizar uma análise e um plano de modernização dos seus motores, o que pode garantir desempenho atrelado à economia”.
Um levantamento publicado há dois anos pela Associação Brasileira de Manutenção e Gestão de Ativos informava que a idade média dos equipamentos instalados em nossa indústria era de 17 anos. Conforme aponta Fernando Garcia, sabendo que esse padrão se manteve nesse período, é possível deduzir que hoje a idade média dos equipamentos é de 19 anos. “Sob este ângulo, a grande maioria dos motores elétricos hoje na indústria está defasada, do ponto de vista de eficiência energética. A defasagem depende da realidade de cada unidade, mas o importante é que uma avaliação seja realizada para verificar o tamanho do desperdício e de que forma a questão deve ser tratada. A mesma publicação indica que aproximadamente 10% dos motores instalados possuem mais de 40 anos de uso, provavelmente com várias queimas e rebobinamentos realizados, o que pode aumentar a ineficiência. Os níveis de defasagem encontrados podem ser assustadores”, complementa o diretor da WEG.
Fernando lamenta que no Brasil o custo de aquisição ainda seja o fator mais considerado, na hora da compra. Assim, destaca ele, é comum que se compre o motor mais barato, sem considerar o custo de energia ao longo da vida útil do equipamento. “Isto faz com que a esmagadora maioria dos motores comprados antes de 2020 sejam de nível de eficiência menor que IR3. Se a compra foi antes de 2010, quando houve a penúltima mudança da lei, definindo o nível mínimo IR2, provavelmente o nível de eficiência será ainda menor. Pior ainda se a aquisição foi antes de 2001, quando se instituiu o IR1, pois antes não havia nível de eficiência mínimo requerido”, analisa.
Diante das estatísticas preocupantes, checar se os equipamentos estão defasados ou não, em relação ao nível de eficiência energética, pode ser encarado como uma estratégia obrigatória, para as empresas que possuem vários motores em seu parque produtivo.
O primeiro passo, observa Cristiano Pless, é olhar a placa dos motores e avaliar qual índice está especificado, IR1 (Rendimento Standard), IR2 (Alto Rendimento) ou IR3 (Rendimento Premium).
Indo adiante, Felipe Oliveira recomenda realizar um levantamento dos motores instalados, seus níveis de rendimento nominal e quantas vezes esses motores já foram rebobinados. “O ideal é que as empresas façam um plano de modernização e troca por motores IR3, a começar pelos equipamentos mais antigos e mais reparados. A cada rebobinamento o motor está susceptível a uma redução do seu rendimento e consequente aumento no consumo de energia”, informa.
Além disso, prossegue Felipe, deve ser feita uma análise cautelosa não apenas do motor, mas do método de acionamento. “Em alguns casos, a troca do motor com a utilização de um inversor de frequência pode chegar a uma economia de 80% no consumo de energia. Caso as empresas necessitem de apoio neste processo, a ABB e seus parceiros oferecem o serviço de análise em campo com estudo de eficiência energética”, divulga.
Segundo Fernando Garcia, uma forma objetiva de avaliar se é conveniente substituir o motor por nível de eficiência ou queima pode ser feita pelo software See+, uma ferramenta disponibilizada pela WEG e que estaria ajudando muitas empresas na autoavaliação. “A WEG também possui o Centro de Negócios de Eficiência Energética, que realiza projetos nos seus clientes em conjunto com a rede WE³ – WEG Especialista de Eficiência Energética. São equipes capacitadas a identificar os desperdícios e propor soluções”, descreve.
Reflexos no mercado
Fernando Garcia entende que os parâmetros estipulados pela nova portaria deverão estimular um salto de eficiência nos equipamentos novos. “A grande oportunidade está nos cerca de 20 milhões de motores elétricos trifásicos rodando hoje no Brasil e concentrados na indústria”, frisa. Em tese, 100% do mercado é formado por potenciais clientes, porque todos precisam atender à legislação.
A WEG informa que ao mesmo tempo vem promovendo o uso dos equipamentos ainda mais eficientes, nos níveis IR4 e IR5. “Nada contra o IR3, mas o custobenefício mostra que com os pesados custos de energia no Brasil, o caminho é investir em eficiência. Há muitos cases de sucesso implantados, soluções técnicas disponíveis no mercado, soluções financeiras e programas de incentivo, como os de Bônus de Motores coordenados pela Aneel e implantados pelas distribuidoras de energia. Mas falta que a informação chegue aos tomadores de decisão, e isto notadamente não ocorre hoje, pois indicadores como TIR (Taxa Interna de Retorno) e VPL (Valor Presente Líquido) nos projetos de eficiência energética são praticamente imbatíveis, na comparação com outros investimentos realizados rotineiramente pelas empresas”, analisa Fernando.
O diretor da WEG lembra que outro benefício gerado pelo novo índice de rendimento será a redução do custo da energia elétrica, que representa quase a totalidade dos custos registrados ao longo da vida do motor elétrico.
Tomando como exemplo um período de dez anos, os custos de aquisição e instalação de um motor representam 2,5%. A manutenção equivale a 1,5%. Já o custo da eletricidade utilizada beira a casa dos 96%. Com a redução do consumo de energia elétrica vem a diminuição dos custos, o que ajuda a dar maior competitividade aos usuários dos motores elétricos.
Para Fernando, a mudança de cultura virá com a consciência das próprias empresas, fato que já estaria ocorrendo, embora a passos lentos, face à urgência que o País precisaria para ser mais competitivo em nível mundial. “Para uma mesma produção, gastamos mais energia que os países desenvolvidos. Estes melhoram frequentemente, pois têm uma taxa maior de renovação dos equipamentos, criando uma idade de parque instalado que equivale à metade da nossa”, compara.
Segundo Felipe Oliveira, com a adoção do índice IR3, o Brasil passa a estipular níveis de rendimento mínimos para os motores elétricos semelhantes aos adotados na Europa. “Como os motores elétricos são os equipamentos que mais consomem energia elétrica nas indústrias, um aumento no rendimento destes equipamentos, mesmo que singelo, tem o potencial de reduzir consideravelmente a energia elétrica consumida no País, beneficiando assim a todos”, considera.
O especialista da ABB confirma que desde o anúncio da nova portaria o mercado já vem se preparando e cada vez mais requisitando motores IR3. “Como desde agosto de 2019 não é mais autorizada a fabricação de motores que não atendam à portaria, a procura por motores que atendam aos níveis IR3 só tende a aumentar”, acredita.
Felipe diz que a energia elétrica consumida por cada motor é muitas vezes invisível para as empresas, mas ela pode passar dos 95% dos custos totais ao longo da vida útil do equipamento. Assim, prossegue ele, é necessário que as empresas tenham esta ciência e enxerguem nos motores mais eficientes e nas novas tecnologias não um custo em si, mas um investimento. “Há casos onde a utilização de motores mais eficientes juntamente com inversores de frequência reduz o consumo de energia a ponto do investimento se pagar em poucos meses. Para que a adoção de tecnologias de acionamento mais eficientes seja alavancada no Brasil, é necessário que as empresas consigam fazer de forma clara as simulações de economia de energia e retorno no investimento de motores mais eficientes e novos métodos de acionamento. Além de poder contar com a ABB e seus parceiros para estes estudos, a ABB também fornece uma ferramenta completa online, gratuita e em português, onde as empresas podem acessar e realizar as simulações de economia de consumo e retorno no investimento, simulando aplicações de bombas, ventiladores e compressores”, indica o executivo da ABB.
Cristiano Pless reforça que o custo da energia elétrica tem se tornado um fator determinande de competitividade nas empresas e, desta forma, já desperta uma atenção especial por parte das empresas: “A redução no consumo de energia em motores elétricos pode representar um ganho significativo, pois estudos mostram que quase 75% da energia consumida no setor industrial provêm de motores elétricos”.
O executivo acrescenta que os motores elétricos da Hercules possuem excelente resultado ao combinar um projeto de altíssima eficiência com materiais nobres e redução de peso, ruído e tamanho, em função de otimizações na linha e carcaça em alumínio. “O mercado já reconhece a marca Hercules como um dos melhores resultados neste quesito, o que, por consequência, tem gerado aumento na demanda”, comemora.
Cristiano acredita que a linha de motores IR3 irá se consolidar como uma opção consistente de redução de consumo energético na indústria e tende a aumentar gradativamente, substituindo motores antigos de baixo desempenho e muitas vezes rebobinados. O porta-voz avalia que a legislação brasileira com relação a motores é bastante sólida, mas diz que quando se trata de motores acoplados a máquinas, existem regulamentações específicas que não estariam priorizando o consumo de energia. “Uma ampliação na abrangência de motores acoplados poderia aumentar ainda mais a economia gerada pela norma IR3”, defende. Por fim, Cristiano lembra das vantagens proporcionadas para o meio ambiente, por conta do melhor gerenciamento da eletricidade: “Como os motores elétricos são responsáveis por boa parte do consumo de energia elétrica no País e no mundo, a redução no consumo promoverá grandes benefícios para a natureza, para nossa geração e para as gerações futuras”.
Manutenção
A manutenção dos motores é fundamental para assegurar a vida útil dos equipamentos e menor consumo de energia.
Felipe Oliveira, da ABB, diz que as corretas lubrificação, alinhamento e balanceamento do conjunto de acionamento geram menor atrito e menos perdas no motor. A manutenção preventiva de limpeza interna, com troca dos rolamentos, também garante melhor desempenho. Felipe avisa: o ideal é que esses serviços sejam realizados por profissionais devidamente capacitados: “Caso a empresa não possua tais profissionais ou oficina apropriada, ela deve entrar em contato com a rede de assistência técnica credenciada”.
Para Cristiano Pless, da Hercules, os principais itens a serem verificados e mantidos em boas condições são os mancais (rolamentos) e o sistema de ventilação, que não pode estar obstruído por poeira ou qualquer outro material.
A WEG destaca a importância da especificação e da correta instalação dos motores e que é preciso fazer as relubrificações recomendadas pelo fabricante, além das inspeções de rotina visuais, de temperatura e de vibração. A empresa oferece a solução Motor Scan, um sensor que permite o envio das informações do motor à WEG IoT Plataform, com um acompanhamento de seu estado sem a necessidade de um inspetor. A WEG informa ainda que possui a maior rede de assistência técnica da área no Brasil.
Qual o aumento de custo previsto?
Olá Gilberto. Infelizmente não temos essa informação.