Uma moda que precisa pegar

Se o Dimensionamento Econômico e Ambiental de Condutores Elétricos é importante para o futuro das instalações elétricas, levando em conta seu apelo não só econômico, mas, especialmente, ambiental, na era da sustentabilidade é fundamental mudar filosofias arraigadas e partir rapidamente para a prática.

Dimensionamento Econômico e Ambiental de Condutores Elétricos. O extenso nome pode sugerir que se trata de algo complicado, mas, na prática, sua aplicação não deixa dúvidas sobre a eficácia e os incontáveis benefícios que gera ao privilegiar a segurança, a qualidade e a durabilidade das instalações elétricas. O verdadeiro “complicômetro” da questão, na realidade, reside em outra seara, a financeira. E no Brasil a cultura do mais por menos ainda fala mais alto.

Mas para explicar o fim, vamos entender os meios. A função de um cabo de potência é conduzir a energia elétrica da forma energeticamente mais eficiente e ambientalmente mais amigável possível desde a fonte até o ponto de utilização. No entanto, devido à sua resistência elétrica, o cabo dissipa, na forma de calor, efeito Jaule, uma parte da energia transportada, impedindo que se obtenha 100% de eficiência nesse processo. Como consequência, essa perda requererá a geração de energia adicional que contribuirá para o acréscimo da emissão de gases de efeito estufa (CO2 ) na atmosfera.

A energia dissipada por esses cabos precisa ser paga por alguém, transformando-se assim em um acréscimo nos custos operacionais do equipamento que está sendo alimentado e da instalação elétrica como um todo. Essa sobrecarga financeira se estende por toda a vida útil do processo. E como o custo da energia tem peso cada vez mais importante nas despesas operacionais das edificações, todos os esforços possíveis devem ser feitos para conter gastos desnecessários.

Os aspectos ambientais e conservacionistas relacionados com a energia desperdiçada também são importantes fatores, cada vez mais levados em consideração. Estudos revelam que, ao longo do ciclo de vida dos fios e cabos elétricos, as mais significativas emissões de CO2 são produzidas quando os condutores estão sendo utilizados no transporte de energia elétrica, sendo relativamente pequenas na fase de fabricação e descarte desses produtos. Essas emissões são resultantes da geração extra de energia necessária para compensar as perdas Joule na condução da corrente elétrica pelo circuito. Dessa forma, mantidas todas as demais características da instalação, a maneira mais adequada de reduzir as perdas e, consequentemente, as emissões é aumentar a seção nominal dos condutores elétricos.

É neste momento que voltamos à afirmação feita acima: aumentar a seção nominal significa elevar o custo inicial de cabos, acessórios, linhas elétricas e mão de obra da instalação. É ponto pacífico que a melhor ocasião para se considerar a questão é na etapa de projeto, quando custos adicionais são marginais. Afinal, não é difícil compreender que, após a instalação finalizada, fica muito mais complicado e caro incorporar melhorias.

Para Hilton Moreno (foto), sócio-diretor do Grupo HMNews e responsável pelo programa e pela elaboração do manual “Dimensionamento Econômico e Ambiental de Condutores Elétricos”, do Instituto Brasileiro do Cobre (Procobre), esse tipo de pensamento, ainda bastante forte no Brasil, de privilegiar preço em detrimento da qualidade e da sustentabilidade precisa mudar, e rápido. Ele afirma que elaborar um projeto levando em conta o dimensionamento econômico e ambiental, afora o custo inicial, um pouco maior, só traz benefícios. E este custo, muitas vezes, nem é tão alto assim.

“A evolução das sociedades em busca do desenvolvimento sustentável somente é possível se revisarmos conceitos e chavearmos a mente em relação à forma como enxergamos o mundo. No caso da área elétrica, não é diferente. Temos que mudar nossa cabeça de caneta para cabeça de automóvel se quisermos que a área elétrica colabore ativamente com a sustentabilidade”, comenta Hilton.

E ele explica a analogia: “Tudo o que se espera de uma caneta é que ela escreva legivelmente, não falhe, dure um bom tempo e tenha um custo adequado, geralmente o menor possível. Em outras palavras, busca-se a melhor relação entre o custo inicial da caneta e o benefício de utilizá-la da melhor maneira possível. No caso do automóvel, além de considerar o custo inicial, não se deve esquecer os custos operacionais (inclusos os de manutenção), representados pelo licenciamento, seguro, troca de óleo e pneus, combustível, multas, lavagens, serviços mecânicos em geral, dentre outros. No entanto, no caso dos automóveis, há um terceiro custo muito importante, mas igualmente muito esquecido pelos compradores: o custo ambiental”.

Em resumo, durante o processo de decisão de aquisição de alguns tipos de bens, deve-se olhar a questão pelos lados dos custos inicial e operacional, que, em diversos casos, é muito maior do que o inicial. “Mas, infelizmente, as instalações elétricas ainda são vistas como canetas. Isso implica que o mais importante, e às vezes o único critério, para selecionar e comprar instalações elétricas é o custo inicial. A péssima notícia é que as instalações elétricas são ‘automóveis’ e não ‘canetas’. Elas têm custos iniciais, operacionais e ambientais e todos precisam ser levados rigorosamente em conta”, defende Hilton.

O dimensionamento ambiental na prática

Desde sempre os circuitos elétricos de baixa, média e alta tensão são dimensionados pelos critérios técnicos constantes nas normas NBR 5410 e NBR 14039, que incluem seção nominal mínima do condutor, capacidade de condução de corrente do condutor em regime permanente, queda de tensão no condutor, proteção do condutor contra sobrecarga e proteção do condutor contra curto-circuito.

Ao utilizá-los, o resultado será sempre a menor seção nominal de um condutor que seja adequada para determinado circuito de forma a garantir a segurança e a operação da instalação. E, mesmo que a seção de um condutor tenha sido aumentada para atender, por exemplo, a queda de tensão, ainda assim, o efeito será a menor seção nominal para atender tal critério.

A Física ensina que quanto menor a seção de um condutor, maior sua resistência. E quanto maior a resistência, maior a energia nele dissipada. Por outro lado, essa energia dissipada é gerada em uma fonte que emite maior ou menor quantidade de dióxido de carbono na atmosfera em função da sua matriz energética. Usinas eólicas e fotovoltaicas emitem muito menos quantidades de CO2 do que as de carvão ou óleo, e assim por diante.

A emissão de CO2 é diretamente proporcional à energia dissipada no condutor e, consequentemente, proporcional à sua resistência, mas inversamente proporcional à seção nominal do condutor. Explicando melhor: mantido o comprimento de um condutor, a corrente elétrica que nele circula e o tempo dessa circulação, se for aumentada a seção do cabo, automaticamente é reduzida a emissão de CO2 na atmosfera. Esse é o princípio do chamado Dimensionamento Ambiental de Condutores Elétricos.

Ao longo do ciclo de vida dos fios e cabos elétricos, as mais significativas emissões de CO2 são produzidas quando os condutores transportam a energia elétrica, sendo relativamente pequenas na fase de fabricação e descarte desses produtos. Assim, haverá um ganho ambiental sempre que, num período considerado, as emissões de CO2 evitadas durante a operação do cabo forem menores do que as realizadas para sua fabricação.

O aumento da seção dos condutores quando dimensionados pelo critério ambiental tem como consequência direta o aumento nas emissões de CO2 no processo completo de fabricação dos cabos elétricos, desde a fase de extração do metal condutor na mina até o descarte do produto após sua utilização (ciclo de vida do produto). Isso se deve ao fato de que seções maiores utilizam mais materiais e, consequentemente, mais energia é consumida na fabricação e demais etapas da vida do produto.

Por outro lado, as reduções nas emissões obtidas pelo uso de cabos de maiores seções durante a vida econômica considerada compensam os aumentos gerados no processo de fabricação dos cabos com maiores seções. Em outras palavras, um pelo outro, representa o ganho ambiental resultante da redução das emissões de CO2 em função do dimensionamento econômico dos condutores.

Trocando em miúdos, a melhor maneira de diminuir os custos operacionais e ter menor impacto ambiental é aumentar a seção dos condutores elétricos. E para auxiliar nessa tarefa, em 2011, foi criada a ABNT NBR 15920, que relaciona o dimensionamento de condutores elétricos com a economia de energia e com a redução de CO2 . Era o que faltava para complementar a ABNT NBR 5410, que já contemplava cuidados com a segurança das pessoas e do patrimônio, mas não considerava as questões ambientais. Com as diretrizes em mãos, restava uma ferramenta capaz de facilitar o trabalho, que envolve muitos cálculos e inúmeras variáveis. Dessa necessidade, nasceu um programa que dimensiona os circuitos levando em conta aspectos de economia de energia e os efeitos desse dimensionamento sobre o meio ambiente. Desenvolvido pelo Procobre, o software é direcionado para profissionais envolvidos com instalações elétricas interessados em calcular circuitos elétricos com condutores de cobre de baixa tensão até 1.000 volts pelos critérios de dimensionamento econômico descrito na NBR 15920 e ambiental. Além do software, o manual, elaborado em 2010, traz critérios de dimensionamento econômico para todos os tipos de instalação elétrica de baixa tensão, prediais, comerciais e industriais e redes de distribuição de energia.

O Procobre também realizou estudos de casos utilizando a norma NBR 15920 e o software para verificar a economia de energia e a redução das emissões de CO2 em seis tipos de edificações. Em todos houve economia de energia e ganho ambiental pela aplicação dos critérios da norma em questão. Para cada um foram consideradas diversas alternativas de tarifas de energia, tempo de funcionamento da instalação, vida útil estimada da obra, taxa de juros e outros parâmetros que fazem parte das fórmulas de cálculos. No total, foram calculados mais de 4.000 circuitos, com resultados variados, o que demonstra que a análise deve ser criteriosa para cada caso.

O resultado mais significativo foi verificado em um dos shoppings. Pela estimativa calculada, caso o dimensionamento econômico e ambiental fosse utilizado, em um prazo de 30 anos, o complexo registraria um ganho ambiental de 380 toneladas de CO2 e economizaria cerca de 2.220.700 kWh de energia.

O ganho ambiental e o futuro

Com as ações cada vez voltadas à sustentabilidade em todos os setores, certamente as redes elétricas não ficarão de fora desse contexto, especialmente se considerar a disponibilidade dos conceitos e equações para abordar tal tema. É apenas uma questão de tempo, e vontade, para que as normas técnicas e os procedimentos de cálculo em geral incluam o requisito ambiental.

“Um bom começo seria que normas como a NBR 5410 e NBR 14039 incluíssem em seus textos os critérios de dimensionamento ambiental e econômico, conforme NBR 15920. Com certeza, o meio ambiente agradeceria essa iniciativa. O Japão, por exemplo, está revisando sua norma de instalações elétricas de baixa tensão para incluir, de modo compulsório, o dimensionamento ambiental de condutores elétricos naquele país. Esse pode ser um ótimo exemplo para o resto do mundo”, finaliza Hilton Moreno.

Lá e cá

A preocupação com a eficiência energética e com a sustentabilidade das redes elétricas em geral motivou o Instituto Brasileiro do Cobre (Procobre) e a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) a criarem uma norma brasileira que associasse o dimensionamento elétrico das edificações à eficiência energética (economia de energia). Uma comissão de estudos foi formada e, dois anos depois, estava elaborada a ABNT NBR 15920:2011 – Cabos elétricos – Cálculo da corrente nominal – Condições de operação – Otimização econômica das seções dos cabos de potência.

Levando em conta o apelo inicial, a norma se baseia no fato físico que o redimensionamento adequado da seção de um condutor elétrico promove menos perda de energia, reduzindo, assim, o consumo e, por consequência, o preço da conta de luz, além de diminuir a emissão de gases do efeito estufa, o CO2 (dióxido de carbono).

Embora nova à época para os brasileiros, a norma foi uma tradução literal da IEC 60287-3-2 Ed. 1.0 b – Electric cables – Calculation of the current rating – Part 3: Sections on operating conditions – Section 2: Economic optimization of power cable size, publicada em 1995. Ou seja, a preocupação com a eficiência energética relacionada com o dimensionamento dos condutores elétricos é uma demanda antiga na comunidade internacional.

É importante destacar que a ABNT NBR 15920 trata somente da escolha econômica de seções de condutores com bases em perdas Joule. As perdas por tensão não foram consideradas no documento.

4 thoughts on “Uma moda que precisa pegar

  • 29/03/2021 em 11:01
    Permalink

    Eu acredito que estamos no caminho certo, os profissionais da are deve ter consciencia da nossa realidade e contribuir para um bom entendimento e colocar em pratico, Seguindo todas as normas é claro .

    Resposta
  • 29/03/2021 em 08:53
    Permalink

    Realmente um tema importante para estudar e compreender. Mas como estamos no Brasil e como o próprio Hilton disse no texto, a cultura do menos por mais, é um impedimento. Ainda mais se tratando de elvação de custos de um projeto.

    Resposta
  • 29/03/2021 em 07:39
    Permalink

    MUITO BOM TEMA
    MAIS CONHECIMENTO PARA A BIBLIOTECA DO TÉCNICO.

    Resposta
    • 29/03/2021 em 13:47
      Permalink

      Muito obrigado, Paulo!

      Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.