O futuro pertence a todos
Você acabou de participar de uma conversa, reunião ou foi a uma palestra em que o tema foi inovação disruptiva ou transformação digital e saiu de lá com a nítida sensação de que precisa fazer urgentemente alguma coisa ou será engolido pelo novo. Calma!… de fato isso irá acontecer e não adianta se desesperar.
Observo muitos executivos ou donos de negócios em desespero no segundo após em que se dão conta (apesar de que muitos não se deram conta ainda) de que as novas tecnologias mudaram muitas regras de negócio e de que o mercado que até então era dominado por eles já mudou.
No segundo segundo (dois segundo após se darem conta), como se uma onda de adrenalina os tomasse para correr e salvar seus negócios e suas carreiras, decidem agir de imediato. E nesse momento perdem o jogo da inovação.
Perdem o jogo porque partem para ações isoladas e pontuais no sentido de darem uma resposta ao sentimento de ameaça que os tomou. Em poucos dias já contrataram uma consultoria em inovação, colocaram todos seus funcionários em um workshop ou contrataram um novo software que promete resolver todos os problemas da empresa, ou pior, criam um departamento de inovação e começam a participar de eventos de starups com o objetivo de comprar alguma.
Sim, as novas tecnologias são uma ameaça aos modelos de negócios tradicionais, mas se revisarmos todos os clássicos exemplos já explorados, nenhum deles resultou na morte imediata das empresas tradicionais.
Pensemos no clássico caso da Kodak, tão utilizado como exemplo de inércia diante da inovação. Da recusa da empresa em 1989 de investir em câmeras digitais, por canibalizar seu negócio de filme, até que as vendas de câmeras digitais superassem as tradicionais, em 2003, se passarem 14 anos.
Busquemos um caso mais moderno e ainda mais emblemático por se tratar de uma queda vertiginosa. Da criação da Netflix, em 1997, até a quebra da Blockbuster, em 2010, passaram-se 13 anos, sendo que no meio deste período, em 2004, a Blockbuster atingiu seu maior valor de mercado e atingiu 9.094 lojas em todo o mundo.
Certamente que a inovação disruptiva ou a transformação digital são essenciais para o futuro dos negócios, apenas afirmo que se isso for feito sob o domínio do medo, e, portanto, de forma desesperada, o resultado será um atraso em promover a verdadeira transformação digital, e isso sim poderá prejudicar consideravelmente os negócios.
A transformação digital não é uma ação isolada, mas sim um processo. Promover mudanças pontuais na área de marketing e TI não é transformar nada, no máximo será uma medida para não ficar atrás dos demais concorrentes que já iniciaram alguma ação.
O primeiro passo é justamente esse, deixar de lado a visão fragmentada e entender que se trata de um processo e que a transformação digital, para de fato acontecer, terá que promover uma mudança de filosofia de gestão de forma a permear todas as áreas da companhia.
O segundo é ficar calmo e perceber que o negócio não irá sucumbir amanhã, no entanto, não se pode dormir em berço esplêndido esperando agir depois que alguma inovação surja para ameaçar o negócio – nesse momento já será tarde.
Com base nos exemplos que foram dados, não se pode esperar 10 ou 15 anos, mas promover uma mudança que irá envolver ao final todas as áreas da empresa pode e deve ao menos contar com 3 a 6 anos.
Nesse sentido, algumas recomendações podem ser úteis:
Respire fundo. Tome um respiro de alguns meses, frequente cursos, palestras, viagens e converse com quem de fato conheça da realidade dos negócios e sua relação com a inovação, depois disso, passe mais um mês pensando estrategicamente em seu negócio, só então comece a planejar sua estratégia de transformação digital.
Engaje as equipes. Nesse processo, será fundamental o envolvimento das equipes. Qualquer transformação de cima para baixo, que não envolva de fato aqueles que fazem o negócio acontecer todos os dias, não irá promovê-la nos corredores, irá consciente ou inconscientemente sabotar qualquer iniciativa de mudança.
Tendo liderado alguns processos de mudança, costumo dizer que os steakholders (clientes, fornecedores, colaboradores) se dividem em 3 grupos: 1. aqueles que também querem a mudança, e que para serem engajados basta comunicá-los e convidá-los a participar; 2. aqueles que não vão tomar partido até verem de fato se é para valer, se a mudança acontecer, passarão a apoiá-la, mas caso não saia do discurso, serão os primeiros a boicotá-la; e 3. aqueles que você nunca saberá o motivo, mas que em nenhuma hipótese vão apoiar qualquer mudança.
Patrocínio: Outro fator determinante é o que chamo de patrocínio. Que neste caso é menos financeiro que moral. Como qualquer processo de mudança há dores que para serem enfrentadas será necessário o endosso do CEO, Presidente ou donos da companhia ou ninguém irá se comprometer com seus resultados.
Caso o patrocínio deixe de ser dado no momento crítico do processo de mudança, será inevitável que os líderes e colaboradores já sabendo do esvaziamento desse patrocínio vão quase que automaticamente buscar o culpado do fracasso, que provavelmente será demitido, mas na maioria dos casos de forma injusta, pois sabendo-se que a transformação digital é sistêmica e deverá permear todas as áreas e que sem patrocínio ela não tem como acontecer, a culpa não é de uma pessoa, mas de toda a empresa ao enfrentar sua transformação.
Uma vez que está convencido do caminho a ser tomado, de forma consciente e estiver preparado para o processo de transformação, que inevitavelmente terá dores, então será o momento de buscar, sejam consultorias ou treinamentos que promovam este processo.
Mas ainda há o caso em que mesmo convencido de mudar, o executivo ou dono da empresa não se vê capaz de fazer isso, pois sua forma de pensar e agir em nada tem a ver com tudo que se exige de uma pessoa nessa posição para promover a transformação digital. Se esse for o caso, antes de mais nada, parabéns! Reconhecer isso requer coragem.
Mesmo assim, não há motivo para desespero, pois muitas vezes se confunde o negócio com suas fontes de recursos. O fato de um modelo de negócio não ter perspectivas de futuro num cenário de inovação disruptiva não significa que todo o valor que criou simplesmente desaparecerá da história. Uma empresa tradicional e bem-sucedida por anos certamente tem por trás dela credibilidade, recursos e contatos que a tornaram uma empresa consolidada, o que é um ativo fundamental para quem está começando.
Neste cenário, a criação de um departamento de inovação ou ao menos a criação de um plano de investimento em startups é uma maneira viável para buscar a transformação.
Enfim, a boa notícia é que não há motivo para desespero, o futuro pertence a todos! A má notícia é que nem todos pertencerão ao futuro, pois mesmo sem desespero a inovação e a transformação digital são inevitáveis. Com já disse Bill Gates: “Em alguns anos vão existir dois tipos de empresas: as que fazem negócios pela internet e as que estão fora dos negócios”. Escolha com calma seu caminho.
Bruno Maranhão – Especialista em Inovação e Consultor Fundador da Ventana Consultoria