🥇 Matéria de Capa da Edição 236 da Revista Potência
Reportagem: Paulo Martins
Maior parte dos custos de uma edificação vem da operação e manutenção; certificação ajuda a reduzir gastos operacionais

O universo das construções sustentáveis constitui um mercado em franco crescimento em todo o mundo, incluindo o Brasil.
Em busca de benefícios como diminuição dos custos operacionais, valorização do imóvel para revenda ou arrendamento e modernização da edificação, proprietários e administradores têm investido cada vez mais na diferenciação dos imóveis comerciais, empresariais e residenciais a fim de obter certificações ambientais.
O Leadership in Energy and Environmental Design ou LEED, é um sistema internacional de certificação e orientação ambiental para edificações utilizado em mais de 160 países, e possui o intuito de incentivar a transformação dos projetos, obra e operação das edificações, sempre com foco na sustentabilidade de suas atuações.
Atualmente o Brasil é 4º colocado no ranking de 165 países em relação ao LEED. Conforme informa Enzo Tessitore (foto), LEED Fellow – diretor de Marketing e Operações do Green Building Council Brasil, o país conta hoje com 1.244 projetos certificados LEED. No mundo, esse número supera 107 mil. “O crescimento é constante e vem se espalhando por diferentes setores e regiões do país. É importante observar que esse avanço aconteceu majoritariamente por iniciativa da própria cadeia produtiva. Empresas que entenderam o valor de um green building sem depender de exigência regulatória. Com a nova taxonomia brasileira e a ampliação dos critérios sustentáveis no crédito e investimento, há potencial para um novo ciclo de aceleração”, vislumbra.

LEED Fellow – Diretor de Marketing e Operações do Green Building Council Brasil
De acordo com o Green Building Council Brasil, o LEED é o sistema de certificação de edifícios verdes mais reconhecido e utilizado no mundo. A certificação LEED fornece diretrizes abrangentes para a construção de projetos saudáveis, eficientes e econômicos, promovendo benefícios ambientais, sociais e de governança.
Esta certificação funciona para todos os edifícios e pode ser aplicada a qualquer momento no empreendimento. Os projetos que buscam a certificação LEED serão analisados por 8 dimensões. Todas possuem pré-requisitos (práticas obrigatórias) e créditos (recomendações) que à medida que forem atendidos, garantem pontos à edificação. O nível da certificação é definido conforme a quantidade de pontos adquiridos, podendo variar de 40 pontos a 110 pontos. Os níveis são: Certificado, Silver, Gold e Platinum.
Os critérios avaliados para obter a certificação LEED são:
- Projeto Integrado (IP)
- Localização e Transporte (LT)
- Implantação (SS)
- Eficiência do uso da água (WE)
- Energia e Atmosfera (EA)
- Materiais e Recursos (MR)
- Qualidade ambiental interna (IEQ)
- Inovação (IN)
- Créditos Regionais (RP)
Benefícios da Certificação LEED
Benefícios econômicos
- Diminuição dos custos operacionais
- Diminuição dos riscos regulatórios
- Valorização do imóvel para revenda ou arrendamento
- Aumento na velocidade de ocupação
- Aumento da retenção
- Modernização e menor obsolescência da edificação
Benefícios sociais
- Melhora na segurança e priorização da saúde dos trabalhadores e ocupantes
- Inclusão social e aumento do senso de comunidade
- Capacitação profissional
- Conscientização de trabalhadores e usuários
- Aumento da produtividade do funcionário; melhora na recuperação de pacientes (em Hospitais); melhora no desempenho de alunos (em Escolas); aumento no ímpeto de compra de consumidores (em Comércios).
- Incentivo a fornecedores com maiores responsabilidades socioambientais
- Aumento da satisfação e bem-estar dos usuários
- Estímulo a políticas públicas de fomento à Construção Sustentável
Benefícios ambientais
- Uso racional e redução da extração dos recursos naturais
- Redução do consumo de água e energia
- Implantação consciente e ordenada
- Mitigação dos efeitos das mudanças climáticas
- Uso de materiais e tecnologias de baixo impacto ambiental
- Redução, tratamento e reuso dos resíduos da construção e operação.

O Green Building Council Brasil mantém outras certificações, entre elas, uma específica para a área de energia. Trata-se do GBC Zero Energy – Prédios Autossuficientes em Energia. O GBC Zero Energy é a certificação que reconhece edificações altamente eficientes, capazes de produzir, no mínimo, a mesma quantidade de energia que consomem ao longo do ano. A certificação promove o uso de fontes renováveis, estratégias avançadas de eficiência energética e soluções inovadoras para reduzir o impacto ambiental das construções. Ao adotar o GBC Zero Energy, projetos residenciais e comerciais garantem não apenas economia e resiliência energética, mas também um compromisso concreto com a descarbonização do setor da construção.
Net Zero Energy Building é o edifício que comprova que o consumo de energia local da operação anual é zerado por uma combinação de alta eficiência energética e geração de energia por fontes renováveis.
OBJETIVOS DA CERTIFICAÇÃO GBC Zero Energy:
- Garantir o cumprimento das metas da COP Paris;
- Acelerar a transformação do mercado nacional de eficiência energética e a geração de fontes de energia renováveis;
- Gerar novos empregos;
- Desenvolver novas tecnologias;
- Reconhecer a iniciativa dos empreendedores;
- Promover ambientes mais saudáveis, capazes de propiciar a melhora do bem-estar dos ocupantes.
Maior parte dos custos de uma edificação vem da operação e manutenção
O nível de investimento necessário para obter uma certificação LEED hoje no Brasil depende da experiência da equipe de projeto e da qualidade das decisões tomadas na fase inicial. “Já vimos empreendimentos LEED Platinum que não tiveram acréscimo de custo na construção. O que encarece um projeto não é necessariamente a certificação. É consertar o que foi mal planejado. O segredo está em alinhar intenção, equipe e processo desde o início”, orienta Enzo Tessitore.
Quanto à previsão de retorno desse investimento, o executivo observa que o setor precisa Quanto à previsão de retorno desse investimento, o executivo observa que o setor precisa olhar para o ciclo de vida. “Apenas 15% do custo total de uma edificação está na construção, e os outros 85% vêm da operação e manutenção. Nesse cenário, investimentos que reduzem consumo e aumentam desempenho têm retorno garantido. O payback não está na estética verde, mas na eficiência embutida no projeto”, destaca.
Diante da escassez e do custo elevado de insumos como água e energia, como vemos no momento, é possível que o retorno das ações necessárias para obter a certificação LEED seja potencializado. “A certificação propõe práticas que tornam os edifícios mais eficientes, mas também mais resilientes. Reduzir consumo, diversificar fontes e antecipar riscos operacionais são estratégias que protegem o ativo, especialmente em um cenário de volatilidade climática e pressão sobre os recursos”, aponta Tessitore.
Os chamados green buildings podem contribuir com a sociedade para minimizar os efeitos da crise hídrica e energética vivida pelo País. Enzo Tessitore informa que o setor da construção responde por boa parte do consumo de energia, água e matérias-primas no Brasil. Só as edificações, continua ele, representam cerca de 50% da energia elétrica usada no país, segundo a Empresa de Pesquisa Energética. “Agora imagine o impacto se esses edifícios passassem a consumir um terço disso. A escala da contribuição é clara”, garante.
Indagado sobre os tipos de soluções que um chamado edifício verde pode implantar para ajudar a economizar energia elétrica, durante o processo de qualificação para buscar a certificação LEED, Tessitore diz que o LEED não define uma receita, mas sim o desempenho esperado. Isso dá liberdade para que cada equipe escolha as soluções mais adequadas ao contexto. “Pode ser um sistema de automação, um bom projeto de iluminação, ou simplesmente uma simulação energética bem-feita que revele onde se concentrar. Eficiência vem do projeto, não da tecnologia por si só”, frisa.
Com o advento da energia fotovoltaica, essa modalidade de energia passou a ser utilizada nos empreendimentos candidatos à certificação, dependendo do tipo de edifício. “Em centros urbanos, com torres comerciais de alto consumo e pouca área disponível, a geração on-site tem impacto limitado. Já em empreendimentos logísticos, por exemplo, o uso do fotovoltaico tem crescido bastante. A tecnologia está acessível, o desafio é integrar bem ao projeto e ao perfil do consumo”, pondera Tessitore.

O projeto da edificação exerce total influência na busca de redução de uso de insumos como a energia elétrica. “Arquitetura e engenharia bem-feitas conseguem reduzir significativamente a demanda energética sem depender exclusivamente de sistemas ativos. A simulação energética, quando usada como ferramenta de projeto, e não apenas como formalidade, permite testar cenários e otimizar escolhas. O maior erro é subestimar o valor de um bom projeto”, ensina Tessitore.
Uma vez conquistada a certificação LEED, seja no ambiente corporativo ou residencial, é possível que a consciência ambiental se perpetue naquele ambiente, mesmo com o passar do tempo e com eventuais mudanças dos frequentadores desses ambientes (troca de funcionários de uma empresa, ou inclusão de novos moradores em uma casa ou apartamento, por exemplo). Mas não por inércia. De acordo com Enzo Tessitore, a perpetuação da cultura da eficiência depende de uma operação consciente, com gestão ativa, treinamento e comunicação. “O edifício pode ser excelente, mas se for operado como um convencional, o desempenho real não vai acompanhar. Sustentabilidade não é um evento, e sim um processo contínuo”, ressalta.
Será que a crise hídrica e elétrica vivida pelo País poderá estimular a sociedade a se voltar mais a iniciativas como as propostas pelo sistema de green building? Mas, uma vez superada a crise, com maior disponibilidade de água e energia, o País corre o risco de sofrer uma ‘recaída’, voltando a viver a cultura do desperdício? O que será preciso para implantar de fato uma cultura do consumo consciente no País? Segundo Tessitore, crises sempre forçam movimento, mas não garantem transformação. “O que vimos no Brasil foi uma enorme capacidade da iniciativa privada em se antecipar, muitas vezes antes de haver qualquer incentivo claro. A cultura do desperdício não desaparece com campanhas, mas com estrutura: métricas, contratos, financiamento e política pública coerente. Precisamos parar de tratar eficiência como algo voluntário e começar a tratá-la como parte do risco do negócio. A mudança não é cultural no discurso, é institucional na prática”, defende Tessitore.

CLIQUE AQUI para baixar a Edição 236 da Revista Potência